o Fotógrafo

Fotografia de Gina Granjeia

Foi fotógrafo por passatempo. Tinha comprado uma máquina razoável e lido umas coisas na internet sobre fotografia: para que as fotografias não parecessem assim tão amadoras quanto isso. Resolvera que se haveria de concentrar a fotografar nos dizeres que as pessoas grafitavam nos muros. Na sua maioria eram palavras de ordem política, as suas preferidas. Havia por vezes declarações amorosas, demasiado parecidas umas às outras. E os dizeres filosóficos de taxista. Mas raros eram os poemas, normalmente escolhidos entre o leque de autores do cânone antes de serem abandonados numa parede.
"Eu não quero viver, e tu?" - encontrou uma vez escrito no muro de uma escola. Era grave o que estava a ler, naquele local. A probabilidade de ser um adolescente deprimido e desesperado a ter escrito aquilo era alta. Sentiu que tinha de fazer alguma coisa, apesar disso se querer escorrer pelos seus dedos. A escola era grande, deveria ter centenas de alunos e não conhecia ali ninguém. Dirigiu-se ao portão de entrada e falou com um funcionário:
-Esses miúdos só o que fazem é estragar. Se souber quem foi mando-o limpar a parede.
Insistiu, que era um grito de alerta. Que um jovem poderia estar prestes a suicidar-se. Mas o funcionário só se interessava pela sugidade na parede.
- Pode-me dar a sua identificação? - Perguntou-lhe. Ele era um intruso na escola, estavam já a tratá-lo como suspeito de querer fazer algum dano àquela comunidade. Lá deixou que lhe tirassem fotocópia da sua identificação. Nunca passou lá perto. Sabia-se lá o que poderiam imaginar? Nunca mais tirou fotografias.


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