Metamorfose

Zaina Anwar - retirado daqui:
http://zainaanwar.blogspot.pt/2010_06_01_archive.html


Se me transformei numa barata, porque é que ainda me incomoda que me pisem?

Devemo-nos habituar à nossa condição, especialmente se formos nós que a construímos. Nunca fui ambicioso e aventureiro, porque me hei-de importar por ser mais um empregado de escritório aborrecido com o que faz? Por ser mais um subordinado que se cala aos berros do chefe? Por ser apenas mais um pálido engravatado numa cidade, de pele mais azul que branca? Por as mulheres não olharem para mim? Porque razão me haveria de importar com isso, se eu só tiro o fato e a gravata em casa, que troco por um fato de treino, com que vou ao supermercado ao fim-de-semana, e que nunca conheceu o suor do desporto?

Os momentos de lazer que se resumem à leitura de um jornal desportivo, ao refastelar de TV no sofá, aos almoços de domingo na casa da mãe e da irmã.

Porque me importo com tudo isto? Se não passo de uma barata, porque o hei-de aceitar? Se nunca lutei para que as coisas fossem diferentes, porquê esta revolta, este desejo pelo inverso da minha realidade?

Anos sem sair da cidade. Anos sem ver o mar, sem que a pele se bronzeasse. Anos sem tomar banho no mar ou no rio. Para quê desejá-lo, se me sinto incapaz de passar férias sozinho? Gostava de ter casado, mas talvez a minha vida ainda fosse mais insossa que já é. As mulheres não queriam homens de pele azul e falta de ambição.

Folheei a revista da agência de viagens. Era este ano que vou para a praia e levo a minha mãe!

Sem comentários:

Enviar um comentário