Sobre uma mulher magra

Francisco Goya,
Woman with a fan
A magreza naquela idade não condizia com a vivência que os anos só lhe poderiam ter dado. Os cabelos de menina tapavam os sulcos dos anos. Bebia carioca de limão como almoço, mal se erguendo nos tacões altos. Qual é a história de uma mulher assim? Imaginar-lhe sonhos, aventuras, dramas e amores… o seu aspecto era denunciador de futilidade, e a sua história deveria ser como muitas outras que polvilham revistas cor-de-rosa ou romances de ficção, cujas capas coloridas chegam ao top. Mas seria mesmo assim? Não haveria nada naquela mulher que fizesse a sua história valer a pena? Algo secreto, mórbido, tenebroso, ou um gesto de amor, amizade, solidariedade?
Talvez tenha sido esta a mulher, que numa festa das que tanto ia, na sua juventude, cheia de glamour e a clamar pela beneficência dos pobres, tenha olhado nos olhos do garçon enquanto as amigas enumeravam os jantares, as roupas, as jóias e as viagens, enquanto o marido e os amigos enumeravam os negócios e as amantes. E quando olhou nos olhos daquele rapaz, pouco mais jovem que ela, deixa-se invadir pela tristeza. Tristeza com que ainda hoje sorri. Era jovem, era bela, era rica: tudo podia. Arranjou modo de enfrentar o garçon nessa noite. Beijou-o, mas os lábios dele não lhe responderam:
- Desculpe senhora. Estou aqui para trabalhar, nada mais.


© 2011

1 comentário:

  1. Infelizmente o blogger teve alguns problemas nos últimos dias. Fico feliz de, mesmo assim, continuarem a me visitar

    ResponderEliminar