A Lua não a transformou



A lua cheia já ia alta e era sinal que as horas passavam. Era inverno, a noite estava límpida e fria. Naquela noite, como em todas as de lua cheia, os lobisomens transformavam-se, corriam pelas florestas e uivavam em conjunto.
Ela não tinha nascido assim. Quando chegou à adolescência esperou pela sua primeira transformação e nada aconteceu. Os pais esperaram, como se espera por uma miúda a quem a menstruação aparece tarde.
Tinha 18 anos quando todos constataram que ela era diferente. Naquela altura a relação dos seus pais já estava destruída, e ela só trouxera a resposta que iria desencadear o divórcio. O seu pai não podia ser lobisomem, portanto, a sua mãe teria traído aquele homem a quem chamara pai.
A mãe acabou por se afastar da família e ela ficou sempre com o pai que não era pai e os irmãos que eram só meio irmãos.
Pode ir estudar para a Faculdade porque não se  transformava. Continuou sempre ligada à matilha, e voltou já formada . Decidiu que iria usar o facto de não ser lobisomem como um factor positivo, de diferença para melhor. Foi por isso que estudou medicina, profissão rara na comunidade e que muito fazia falta. Conseguiu ser respeitada, apesar da sua diferença. E amada para além dos da sua família.
Naquela noite suspirava porque era noite de Lua Cheia, e o marido e os filhos corriam na floresta. Nenhum lhe saíra a ela. Suspirava porque era Inverno e se sentia sozinha. Mas era feliz.

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